fevereiro 24, 2017

[Resenha] Lady Susan – Jane Austen

LADY_SUSAN_JANE_AUSTEN_Resenha“Uma obra extraordinária vinda da filha de um pároco do interior, afirma a biógrafa Claire Tomalin em seu livro Jane Austen: A Life (2000).” Lady Susan, uma obra epistolar curta, porém completa, conta a história de uma viúva sedutora e manipuladora de, aproximadamente, trinta e cinco anos de idade. Sua conduta é, aparentemente, irrepreensível, como se esperaria de uma perfeita dama. Dotada de grande beleza, com modos encantadores e supostamente sensíveis, ela consegue desarmar até mesmo aqueles que estão familiarizados com boatos sobre sua má reputação. A relação com a filha, Frederica, uma jovem tímida e submissa, parece ser destituída de qualquer afeição, pois a mãe a trata como mais uma peça em seu jogo maquiavélico, planejando casá-la contra a própria vontade. O livro é um convite ao interior da mente de uma mulher astuta e maliciosa, habituada a brincar com os sentimentos alheios sem nenhuma pitada de remorso.

Editora: Pedra Azul l 111 Páginas l Romance Histórico l Compare & Compre: SubmarinoSaraivaAmazon l Skoob l Classificação: 5/5

Lady Susan, sem dúvida, é o romance mais irônico que já tive o prazer de ler. O que mais admiro na narrativa da Jane Austen é sua capacidade de discorrer sobre as nuanças da mente humana – tanto ao criar personagens reais, quanto ao descrevê-los sob a ótica errônea de qualquer indivíduo minimamente influenciável (que por sua natureza julga com os olhos, antes mesmo do que com a mente). A história da irreverente Lady Susan é cheia de paixão, veracidade, julgamentos precipitados e emoções tipicamente humanas: cobiça, inveja, sedução, manipulação e traição. A obra traz uma protagonista fora do comum, da época e dos livros de romance em geral, que mostra que a bondade e o recato podem ser subestimados. Tenho certeza que os amantes de tramas cheias de intriga e diversão adorarão esse livro repleto de ironia e reflexão.

Lady Susan é uma belíssima viúva de trinta anos. Sua beleza e charme sempre abriram portas sociais para a jovem, permitindo que ela aprendesse desde pequena a manipular as pessoas com seus dotes. Após sua viúves, Lady Susan tratou de unir esforços para casar – digo, despachar – a filha, sua adorável Frederica. Contudo, tais esforços saíram do controle quando o pretendente escolhido não agradou a filha, quando o jovem em questão se deixou levar pelos encantos daquela que seria sua futura sogra e, se não fosse escândalo suficiente, quando a lady aproveitou para encontrar um homem à sua altura e acabou envolvida em um enlace amoroso e extraconjugal. Depois de tanto falatório a solução mais plausível foi fugir para o campo. Assim, Lady Susan parte para Churchill, impondo uma visita repentina a Charles e Catherine, seu irmão – por casamento – e sua cunhada. Imagina-se que a retirada para o campo acalmará os ânimos da incansável Lady Susan, contudo é claro que ela arranjará confusão, irritará sua cunhada e, como era de se esperar, ingressará mais um homem em sua lista de flertes perigosos e desafiantes.

Duas peculiaridades sobre a obra: ela é toda narrada através de cartas (o que significa que conhecemos os protagonistas através das palavras compartilhadas entre os próprios personagens) e ela foi publicada – com um toque de proibido – após a morte da Jane Austen (já que a própria Austen terminou a história mas não considerou publicá-la). Além disso, vale ressaltar que essa minha edição da Editora Pedra Azul possui várias ilustrações maravilhosas que retratam com maestria as artimanhas protagonizadas por Lady Susan.

Sem dúvida o que mais gostei no livro é a maneira como conhecemos Lady Susan. Por ser um romance epistolar, e que traz à tona temas tabus para a sociedade da época, é fácil se deixar influenciar pela opinião dos autores e de suas respectivas cartas. Assim, uma hora desprezamos Susan e sua falta de respeito ao próximo, em outros momentos adoramos sua maneira afiada de manipular as pessoas e vender uma imagem pura e casta – bem diferente de sua personalidade real –, enquanto em outros instantes simplesmente nos deixamos levar pela ironia da narrativa e pela astúcia de uma personagem que usa seu charme para conseguir o que realmente quer: um homem que a mantenha financeiramente satisfeita, uma posição que permita que ela saia por aí sem compromissos e responsabilidades, e um amante que saiba o que uma mulher quer. Em outras palavras, Susan não deixa que a sociedade da época, machista e preconceituosa, molde seu futuro. Suas ações são politicamente incorretas? Claro que são! Mas ainda assim, ela não faz nada que um homem não faça e, exatamente por isso, não deixa que a julguem por causa disso. Amei a dualidade da protagonista. Suas manipulações são dignas do prêmio de melhor atriz, e apresentam uma mulher que não nasceu para viver em função de um casamento ou dos filhos. Talvez seja hipocrisia (até porque não aceito pessoas manipuladoras e falsas em meu convívio diário), contudo não nego que foi impossível deixar de admirar a coragem dessa mulher que desafiou uma sociedade cheia de regras e padrões comportamentais.

Amei o livro do começo ao fim. A narrativa é rápida e fluída – afinal a obra é toda escrita através de cartas e não possui muitas páginas – e recheada de ironias e bom-humor. Aqui percebemos algo que a Jane Austen ama fazer em suas histórias: criar personagens que transbordam vivacidade. A obra, assim como seus protagonistas, traz uma voz afiada e incomum – aliada a fofocas, flertes, noivados cancelados e muitas paixões proibidas. Além disso, os protagonistas da trama levam o leitor a uma profunda reflexão sobre os padrões sociais da época descrita e vivida pela Jane Austen. Nas páginas desse livro (e de tudo o que a autora escreve), percebemos o machismo, a latente desigualdade social, e o casamento como comércio ao invés de fonte de amor. Amo livros reflexivos, divertidos e marcantes, por isso sempre amo as histórias criadas pela Jane Austen.

Vale muito a pena dar uma chance para a autora e aos seus personagens incomuns e cativantes.

Adaptação para o Cinema

Recentemente o livro recebeu uma adaptação para o cinema que agradou boa parte dos fãs da Austen. Ainda não vi o filme, mas confesso estar muito curiosa. Dá uma espiadinha no trailer:

 

Beijos!

 

 

 

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10 Comentários

  • Leticia Golz
    01 março, 2017

    Oi, Pah
    Ahh, fiquei tão curiosa! Adoro tramas reflexivas, mas quanto têm diversão e ironia fica melhor ainda. Adoraria conhecer Lady Susan.
    Descobri muitas coisas com sua resenha: a adaptação que não sabia, que a Jane não ia publicar a obra e que é narrada por cartas.
    Adorei a resenha. Essa editora tem umas ilustrações lindíssimas mesmo! Quero ler!

  • Lara Cardoso
    28 fevereiro, 2017

    A mulher conseguiu construir uma personagem odiosa mas que quem lê, não quer deixar. Diga se Jane não era um gênio?! ela sempre foi muito a frente, e acredito que Lady Susan é aquela cutucada na sociedade da época.

  • Girlene Viey
    27 fevereiro, 2017

    Primeiro precisamos falar dessa capa, acho ela maravilhosa. Adoro essa capa estilo capa antiga que algumas editoras faz, e essa capa super combinou com enredo do livro, onde a historia se passa etc. O que gostei bastante e riqueza de emoções dos personagens do livro, e forte necessidade que autora quis passar de realidade humana. Acho lindo da parte dela, se importar com esse detalhes. Ainda mais a ligação das duas personagens e muito forte e lindo, querendo ou não. Enfim, seria sem duvidas alguma quero ler algum dia

  • Raissa Novaes
    26 fevereiro, 2017

    Olá!
    Realmente Jane Austen consegue sempre criar os melhores personagens. Quero bastante ver esse filme que fizeram e acabei adquirindo o livro do filme para ler esse ano também.
    Beijos!

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  • Thaynara ribeiro
    25 fevereiro, 2017

    Não me lembro de ter lido um enredo narrado através de cartas…. Não sou fã da Jane, mas confesso que ser um livro irônico me atraiu bastante

  • Palavras e Notas
    25 fevereiro, 2017

    Oi, Paola!

    Que livro curto, eu estou bem surpreso por ter sido adaptado para o cinema. O que mais me chamou atenção entre os elogios que fizestes à obra foi o caráter irônico mencionado, mesmo eu não gostando nada da premissa. Que bom que você gostou da leitura, mas não é dessa vez para mim. A resenha ficou ótima! Parabéns!

    Abs.

  • Lili Aragão
    25 fevereiro, 2017

    Oi Paola, eu ouvi falar desse livro da Jane através do trailer do filme, que ainda não vi mas pretendo pois o trailer tá bem interessante. Apesar de gostar muito de romances de época ainda não li nenhum livro da Jane, vi muitos filmes e séries e amo muito todos contudo com relação a leitura e por ela ser uma escritora antiga tenho certo receio de não me adaptar a forma da escrita e acabar tendo dificuldade pra terminar, parece bobagem (kkkk) eu sei e tô colocando como meta ler ao menos um livro dela esse ano, mas acho que não vai ser esse, a narração por carta me incomoda (tentei ler um livro assim há pouco tempo e não consegui terminar). Ainda assim a tua resenha tá incrível e espero poder absorver através do filme, um pouco dos momentos reflexivos e divertidos que te encantaram tanto no livro 😉

  • Caroline Garcia
    25 fevereiro, 2017

    A personagem principal me parece ser bem forte. Uma personagem e tanto, super bem desenvolvida!
    Gostei do que conheci aqui, pois nunca tinha ouvido falar dessa obra.
    Estou bem animada pra ler algo de Jane Austen e toda vez que leio opiniões fico cada vez mais curiosa em relação a sua narrativa.
    Beijos,
    Caroline Garcia

  • adelia_daniela
    24 fevereiro, 2017

    gostei da dica, já vou deixar anotado no skoob!

  • RUDYNALVA
    24 fevereiro, 2017

    Pah!
    Lady Susan parece a maior dissimulada de sua época e até certo ponto, deve ser divertida também por achar que engana a todos quando quer demonstrar sua 'santidade', mas ninguém se engana com ela…
    Deve ser um ótimo livro que questiona o papel da mulher naquela época e mostra que a protagonista é bem a frente de seu tempo, mesmo com atitudes erradas…
    Jane Austin foi ainda mais exímia em se utilizar de cartas na escrita e a edição com ilustrações deve estar mais linda ainda…
    “Quanto mais nos elevamos, menores parecemos aos olhos daqueles que não sabem voar.” (Friedrich Nietzsche)
    cheirinhos
    Rudy
    http://rudynalva-alegriadevivereamaroquebom.blogspot.com.br/
    TOP Comentarista de FEVEREIRO, livros + KIT DE MATERIAL ESCOLAR e 3 ganhadores, participem!