“Uma obra extraordinária vinda da filha de um pároco do interior, afirma a biógrafa Claire Tomalin em seu livro Jane Austen: A Life (2000).” Lady Susan, uma obra epistolar curta, porém completa, conta a história de uma viúva sedutora e manipuladora de, aproximadamente, trinta e cinco anos de idade. Sua conduta é, aparentemente, irrepreensível, como se esperaria de uma perfeita dama. Dotada de grande beleza, com modos encantadores e supostamente sensíveis, ela consegue desarmar até mesmo aqueles que estão familiarizados com boatos sobre sua má reputação. A relação com a filha, Frederica, uma jovem tímida e submissa, parece ser destituída de qualquer afeição, pois a mãe a trata como mais uma peça em seu jogo maquiavélico, planejando casá-la contra a própria vontade. O livro é um convite ao interior da mente de uma mulher astuta e maliciosa, habituada a brincar com os sentimentos alheios sem nenhuma pitada de remorso.
Editora: Pedra Azul l 111 Páginas l Romance Histórico l Compare & Compre: Submarino • Saraiva • Amazon l Skoob l Classificação: 5/5
Lady Susan, sem dúvida, é o romance mais irônico que já tive o prazer de ler. O que mais admiro na narrativa da Jane Austen é sua capacidade de discorrer sobre as nuanças da mente humana – tanto ao criar personagens reais, quanto ao descrevê-los sob a ótica errônea de qualquer indivíduo minimamente influenciável (que por sua natureza julga com os olhos, antes mesmo do que com a mente). A história da irreverente Lady Susan é cheia de paixão, veracidade, julgamentos precipitados e emoções tipicamente humanas: cobiça, inveja, sedução, manipulação e traição. A obra traz uma protagonista fora do comum, da época e dos livros de romance em geral, que mostra que a bondade e o recato podem ser subestimados. Tenho certeza que os amantes de tramas cheias de intriga e diversão adorarão esse livro repleto de ironia e reflexão.
Lady Susan é uma belíssima viúva de trinta anos. Sua beleza e charme sempre abriram portas sociais para a jovem, permitindo que ela aprendesse desde pequena a manipular as pessoas com seus dotes. Após sua viúves, Lady Susan tratou de unir esforços para casar – digo, despachar – a filha, sua adorável Frederica. Contudo, tais esforços saíram do controle quando o pretendente escolhido não agradou a filha, quando o jovem em questão se deixou levar pelos encantos daquela que seria sua futura sogra e, se não fosse escândalo suficiente, quando a lady aproveitou para encontrar um homem à sua altura e acabou envolvida em um enlace amoroso e extraconjugal. Depois de tanto falatório a solução mais plausível foi fugir para o campo. Assim, Lady Susan parte para Churchill, impondo uma visita repentina a Charles e Catherine, seu irmão – por casamento – e sua cunhada. Imagina-se que a retirada para o campo acalmará os ânimos da incansável Lady Susan, contudo é claro que ela arranjará confusão, irritará sua cunhada e, como era de se esperar, ingressará mais um homem em sua lista de flertes perigosos e desafiantes.
Duas peculiaridades sobre a obra: ela é toda narrada através de cartas (o que significa que conhecemos os protagonistas através das palavras compartilhadas entre os próprios personagens) e ela foi publicada – com um toque de proibido – após a morte da Jane Austen (já que a própria Austen terminou a história mas não considerou publicá-la). Além disso, vale ressaltar que essa minha edição da Editora Pedra Azul possui várias ilustrações maravilhosas que retratam com maestria as artimanhas protagonizadas por Lady Susan.
Sem dúvida o que mais gostei no livro é a maneira como conhecemos Lady Susan. Por ser um romance epistolar, e que traz à tona temas tabus para a sociedade da época, é fácil se deixar influenciar pela opinião dos autores e de suas respectivas cartas. Assim, uma hora desprezamos Susan e sua falta de respeito ao próximo, em outros momentos adoramos sua maneira afiada de manipular as pessoas e vender uma imagem pura e casta – bem diferente de sua personalidade real –, enquanto em outros instantes simplesmente nos deixamos levar pela ironia da narrativa e pela astúcia de uma personagem que usa seu charme para conseguir o que realmente quer: um homem que a mantenha financeiramente satisfeita, uma posição que permita que ela saia por aí sem compromissos e responsabilidades, e um amante que saiba o que uma mulher quer. Em outras palavras, Susan não deixa que a sociedade da época, machista e preconceituosa, molde seu futuro. Suas ações são politicamente incorretas? Claro que são! Mas ainda assim, ela não faz nada que um homem não faça e, exatamente por isso, não deixa que a julguem por causa disso. Amei a dualidade da protagonista. Suas manipulações são dignas do prêmio de melhor atriz, e apresentam uma mulher que não nasceu para viver em função de um casamento ou dos filhos. Talvez seja hipocrisia (até porque não aceito pessoas manipuladoras e falsas em meu convívio diário), contudo não nego que foi impossível deixar de admirar a coragem dessa mulher que desafiou uma sociedade cheia de regras e padrões comportamentais.
Amei o livro do começo ao fim. A narrativa é rápida e fluída – afinal a obra é toda escrita através de cartas e não possui muitas páginas – e recheada de ironias e bom-humor. Aqui percebemos algo que a Jane Austen ama fazer em suas histórias: criar personagens que transbordam vivacidade. A obra, assim como seus protagonistas, traz uma voz afiada e incomum – aliada a fofocas, flertes, noivados cancelados e muitas paixões proibidas. Além disso, os protagonistas da trama levam o leitor a uma profunda reflexão sobre os padrões sociais da época descrita e vivida pela Jane Austen. Nas páginas desse livro (e de tudo o que a autora escreve), percebemos o machismo, a latente desigualdade social, e o casamento como comércio ao invés de fonte de amor. Amo livros reflexivos, divertidos e marcantes, por isso sempre amo as histórias criadas pela Jane Austen.
Vale muito a pena dar uma chance para a autora e aos seus personagens incomuns e cativantes.
Adaptação para o Cinema
Recentemente o livro recebeu uma adaptação para o cinema que agradou boa parte dos fãs da Austen. Ainda não vi o filme, mas confesso estar muito curiosa. Dá uma espiadinha no trailer:
Beijos!
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