Pressia pouco se lembra das Explosões ou de sua vida no Antes. Deitada no armário de dormir, nos fundos de uma antiga barbearia em ruínas onde se esconde com o avô, ela pensa em tudo o que foi perdido — como um mundo com parques incríveis, cinemas, festas de aniversário, pais e mães foi reduzido a somente cinzas e poeira, cicatrizes, queimaduras, corpos mutilados e fundidos. Agora, em uma época em que todos os jovens são obrigados a se entregar às milícias para, com sorte, serem treinados ou, se tiverem azar, abatidos, Pressia não pode mais fingir que ainda é uma criança. Sua única saída é fugir. Houve, porém, quem escapasse ileso do Apocalipse. Esses são os Puros, mantidos a salvo das cinzas pelo Domo, que protege seus corpos saudáveis e superiores. Partridge é um desses privilegiados, mas não se sente assim. Filho de um dos homens mais influentes do Domo, ele, assim como Pressia, pensa nas perdas. Talvez porque sua própria família se desfez: o pai é emocionalmente distante, o irmão cometeu o suicídio e a mãe não conseguiu chegar ao abrigo do Domo. Ou talvez seja a claustrofobia, a sensação de que o Domo se transformou em uma prisão de regras extremamente rígidas. Quando uma frase dita sem querer dá a entender que sua mãe pode estar viva, ele arrisca tudo e sai à sua procura. Dois universos opostos se chocam quando Pressia e Partridge se encontram. Porém, eles logo percebem que para alcançarem o que desejam — e continuar vivos — precisarão unir suas forças.
Editora: Intrínseca l 368 Páginas l Compre aqui: Amazon l Skoob l Resenha: Kamila Mendes l Classificação: 5/5
Estamos acostumados com livros ‘bonitinhos’ e suas narrativas limpas e secas, mas quando nos deparamos com uma distopia, sabemos de alguma forma, que nossa visão de mundo literário irá mudar. Confesso que amo livros com personagens lindos que estão em conflito interno e que superam seus problemas em ambientes inóspitos. Contudo, mesmo que as séries Jogos Vorazes e Feios tenham me levado ao mundo do subgênero distopia, nenhuma delas me preparou para a narrativa de Puros.
Em uma época onde os recursos naturais da Terra foram consumidos até seu limite. Quando os oceanos, mares, lagos e fontes de água potável foram contaminados por petróleo, e doenças novas e epidemias criadas em laboratório ameaçam a vida humana, como se preparar para um ataque nuclear?
“Queime um Puro e respire as cinzas
De suas entranhas, faça umas cintas.
Com seus cabelos, teça um cordão.
E de seus ossos faça um Puro sabão.”
Quando li Jogos Vorazes me deparei com um ambiente aflitivo e sufocante. Senti-me reprimida pela mão da Capital e enojada com a presença do Presidente Snow (principalmente na continuação ‘Em Chamas’). Mas Puros triplicou essa sensação, por isso, nessa resenha vou falar muito mais de como me senti ao longo da leitura do quê sobre a história em si, que no geral, (ainda) me deixou em choque, afinal, como já disse, nada do que li até hoje me preparou para o contexto pós-apocalíptico de Puros e seu cenário ligado a explosões nucleares, nunca havia compreendido como uma bomba atômica modifica tudo que sua fumaça tóxica toca.
No livro temos apenas dois personagens ao estilo bonitinho. Patridge e Lyda, dois ‘Puros’. Antes das explosões nucleares um grupo seleto de cientistas, médicos e grandes profissionais, além das famílias influentes e abastadas, foram levados ao Domo com seus filhos. Lá eles assistiram o mundo acabar como ‘um sol sobre o sol’ (expressão usada no livro pelos personagens para descreverem o dia das explosões). O que restou do lado de fora do Domo foi um mundo destruído. Sem esperança, derretido pelo medo e pela dor. Aliás, dor, em suas várias formas, define o livro Puros: a dor de viver em um mundo morto; dor de ver seu corpo ser destruído; dor de saber que não há esperanças; dor por ainda acreditar que há esperança; dor de crescer sem saber ao certo quem e o que você é.
Toda a dúvida e dor dos sobreviventes, ou miseráveis, como são chamados dentro do Domo, é descrita nos capítulos que narram a vida de Pressia Belze, nossa heroína, e Bradwell, nosso anti-herói. Pressia não sabe quem é, tem vergonha de sua mutação (uma de suas mãos foi fundida com a cabeça de sua boneca durante a explosão). Aliás, somente aqueles que entraram no Domo não sofreram nenhuma mutação, do restante, todos foram fundidos com algo. Areia, asfalto, animais de estimação. Mães fundidas aos filhos, que nunca vão crescer, em uma tentativa desesperada de protegê-los. Já não há carne que não seja envenenada e nenhum animal é como ‘Antes’ (O ‘Antes’ é como os sobreviventes definem os dias antes das explosões).
Loucura, desespero e dor definem essa obra. Aliás, a autora Julianna Baggott deixa bem claro, no final de seus agradecimentos, que espera que seu livro leve os leitores a pesquisar mais sobre o mal causado com as bombas de Hiroshima e Nagasaki. Acompanhamos a luta de Pressia para não ser pega pela OBR (espécie de milícia) e sua busca em tentar lembrar algo de seu passado que não esteja ligado com a fuligem e a poeira que ainda cai do céu. Em contrapartida, Patridge, um Puro, foge do Domo em busca de sua mãe e é nele em que eu me vi e me enlacei durante a narrativa. Consegui sentir toda a culpa que o personagem sente por ser ‘Puro’ e a indignação latente dos sobreviventes ao verem um puro em carne e osso.
Sendo assim, o livro é basicamente sobre a busca de Pressia por sua liberdade e identidade, e sobre a procura de Patridge por sua mãe. Nesse decorrer eles se encontram e então vemos muita emoção.
Tenho que confessar que li as primeiras 100 páginas do livro porque me obriguei a lê-las. Não aceito comprar um livro e abandonar sua leitura. A partir da metade do livro, quando finalmente captei a mensagem que a autora quis passar, foi quando não desgrudei mais de suas páginas. Os personagens se tornaram mais reais, suas dores, indecisões, culpas e buscas, passaram a ser minhas também.
Em alguns momentos quis bater em Bradwell por sua arrogância, ou estapear Patridge por sua inocência, quis me revoltar contra o Domo e contra toda desesperança. Senti-me uma sobrevivente.
Ainda estou em choque. Sinto que se falar mais do que já disse entrego a história do livro que, ao mesmo tempo, é complexa e simples. O que posso adiantar é que uma das mudanças de perspectiva que ‘Puros’ trouxe pra mim foi o de beleza. Agora questiono o que realmente é importante nesse mundo, porque, quando perdemos tudo, incluindo a noção de quem somos, a única coisa que sobra é o que está em nossos corações, aquilo em quê acreditamos. Comecei a ver beleza no que o ‘mundo’ diz ser feio e abominável.
Recomendo essa leitura para quem tem força de vontade, gosta de desafios e quer algo realmente adulto. Porque, mesmo com a infantilidade de alguns personagens, Puros de forma alguma é um livro infanto-juvenil. Cinco estrelas para o livro e parabéns para a autora que conseguiu me deixar em choque e refletindo sobre o mundo.
Obs: Apenas uma ressalva, a editora deixou escorregões bem esdrúxulos na tradução e por vezes me vi perdida, porque a tradutora confundiu os personagens durante os diálogos. Ponto negativo e que ajudou bastante a eu achar o início do livro chato.
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