Setecentos e trinta e três dias depois da morte da minha mãe, 45 dias após o meu pai fugir para se encontrar com uma estranha que ele conheceu pela internet, 30 dias depois de a gente se mudar para a Califórnia e apenas sete dias após começar o primeiro ano do ensino médio numa escola nova onde conheço aproximadamente ninguém, chega um e-mail. Deveria ser no mínimo esquisito, uma mensagem anônima aparecer do nada na minha caixa de entrada, assinada com o bizarro nome Alguém Ninguém. Só que nos últimos tempos a minha vida tem estado tão irreconhecível que nada mais parece chocante.
Editora: Arqueiro l 288 Páginas l Jovem Adulto l Compare & Compre: Saraiva • Submarino • Amazon l Skoob l Classificação: 4/5
Uma das coisas mais gostosas na escrita da Julie Buxbaum é que ela fala com leveza sobre temas complexos e dolorosos. Senti que a autora conseguiu criar um cenário juvenil simples e verdadeiro mesmo abordando assuntos difíceis como câncer, segundo casamento, disparidade social, bullying e relacionamento virtual. Através de personagens que estão passando por momentos conflituosos de perda e solidão, Julie mostra que todos nós temos várias oportunidades de recomeçar – até quando tudo parece perdido, não podemos deixar de ter fé no amanhã. A trama não é excessivamente dramática ou reflexiva, entretanto, gira em torno de temas reais, cativantes e tocantes à sua maneira. Dessa forma, o livro faz o tipo que une com maestria emoção e diversão. Adorei a leitura, os personagens centrais, as reflexões que ela traz, e o romance fofo e inusitado.
A obra gira em torno de Jessie e do fato de sua vida estar de pernas para o ar: a mãe morreu de câncer, o pai casou novamente com uma praticamente estranha, eles mudaram para a Califórnia, e agora ela vai começar o novo ano letivo em uma escola completamente diferente da que frequentava antes. Além disso, Jessie tem que lidar com o meio irmão que finge que ela não existe, com a estranheza de estar em uma casa que não é a dela, com a distância territorial da melhor amiga e, principalmente, com o pesadelo que é o novo colégio. Na Califórnia e no bairro que moram, Jessie sente que todas as pessoas são ricas, lindas e inatingíveis. Para a jovem não é fácil fazer amizade e muito menos lidar com os comentários ofensivos direcionados a ela (a sua beleza que foge do padrão ou ao seu modo simplório de se vestir). Em outras palavras, a vida da garota não está nada fácil. Só que surgiu uma luz no fim do túnel: Jessie recebeu um e-mail anônimo que promete ajudá-la a enfrentar o colégio. Afirmando ter várias dicas de sobrevivência para a Califórnia, o escritor anônimo vai se tornar um amigo, um confidente e uma força que impulsiona Jessie a seguir em frente. O único problema é que o relacionamento virtual não vai ser suficiente e, uma hora ou outra, eles vão ter que se encontrar. – Quem será o dono dos e-mails anônimos? E como será que Jessie enfrentará todas as mudanças pelas quais está passando?
Gostei bastante da maneira como a autora colocou no papel os típicos momentos juvenis de dúvida e mudança: escola nova, casa nova, cidade nova, amigos novos e as tantas primeiras vezes. Existem muitas histórias que falam sobre essa fase cheia de preconceitos e incertezas, mas a grande maioria é idealizada demais – tanto para o drama quanto para o final feliz. Porém, senti mais leveza e veracidade na história da Jessie; percebi que a autora optou por uma abordagem reflexiva mas que foge do drama que assuntos tão pesados como o câncer e o bullying podem gerar. Além disso, gostei de como a narrativa toma o cuidado de apresentar todos os lados de uma mesma dor: da filha que perdeu a mãe, do marido que perdeu a esposa, do pai e da filha que estão perdidos em suas dores e não conseguem conversar, e de uma nova família – madrasta e meio irmão – que também perderam alguém e estão tentando recomeçar. Achei maravilhoso como a autora, mesmo quando a narrativa em primeira pessoa faz de Jessie uma vítima das escolhas erradas de seus pais ou amigos, força o leitor a enxergar e aceitar o outro lado da moeda. Simplesmente amo histórias que nos fazem refletir sobre os altos e baixos da vida. Não é fácil superar a perda de um ente querido ou enfrentar o bullying, então gostei de como esse assunto foi abordado e de como ele está ligado diretamente com a fase que Jessie está vivendo e com o seu crescimento como garota.
Além da narrativa leve e reflexiva, da importância dos temas abordados e do amadurecimento de Jessie, adorei a troca de e-mails entre ela e o escritor anônimo. Os e-mails e mensagens deixaram o livro ainda mais fofo, juvenil e divertido. Adoro esse tipo de conversa e como ela tende a mostrar o que os personagens realmente pensam e/ou sentem. Além disso, gostei de como as trocas de e-mail deram vida a um possível romance – cheio de dúvidas e inseguranças é claro, mas um tipo de relacionamento que nasce nas sinceras conversas do dia a dia. Nesse quesito a obra me lembrou muito Simon versus A agenda Homo Sapiens (outro livro leve, divertido, reflexivo a sua maneira, e com um romance que gira em torno do anonimato). Claro que se formos refletir o romance não segue a linha do que é politicamente correto, entretanto sem pensar muito é fácil mergulhar nas conversas de Jessie com o anônimo, na maneira como eles confiam um no outro, e do desfecho desse relacionamento.
No geral o livro é fofo e transmite bem as confusões típicas de um jovem adulto. Confesso que esperava mais emoção e um final um pouco mais elaborado – a autora acabou o capítulo na melhor parte! Contudo, nada tira o charme ou diminui a fofura desse livro. Recomendo para os amantes de histórias jovens, leves e cativantes.
Beijos!
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